A mitologia nĂłrdica hĂĄ muito tempo capturou a imaginação popular, e reconhecemos nas suas histĂłrias recheadas com deuses pagĂŁos seus mentores vikings: Ragnar Lodbrok, Björn Ironside, Ivar the Boneless, os lĂderes de um povo escandinavo formado por navegadores guerreiros que visavam impiedosamente as Igrejas e os mosteiros.
A Era Viking, situada entre os sĂ©culos VIII a XI, teve inĂcio na invasĂŁo da costa leste da Britannia, e quando terminou os vikings jĂĄ eram adeptos do Cristianismo, o que Ă© surpreendente e inesperado, especialmente porque suas batalhas sangrentas sempre foram consideradas uma luta entre o paganismo e a cristandade.
Mas isto é apenas parte da história, porque os vikings também difundiram a Fé cristã. Na Escandinåvia, a Noruega e a Suécia converteram-se tardiamente ao Cristianismo, e existem obras fascinantes na literatura nórdica que apresentam temas cristãos complexos, incluindo as sagas dos santos nórdicos.
O paganismo dos vikings nem sempre era um problema para as comunidades cristãs. Um exemplo do pluralismo religioso encontra-se na arqueologia, onde um molde de pedra-sabão do século X indicou a fundição de um amuleto de metal composto pelo martelo de Thor (Mjolnir) ao lado de duas cruzes - um adereço na forma de pendente.
O primeiro rei escandinavo convertido foi o dinamarquĂȘs Harald Klak. Ele foi batizado em 826 AD a pedido do imperador carolĂngio LuĂs, o Piedoso, em troca do seu apoio na tentativa de recuperar o trono. Guthrum, um rei Viking do sĂ©culo IX, foi batizado apĂłs sua derrota para o rei da SaxĂŽnia, 'Alfredo, o Grande', em 878 AD.
Os reis cristĂŁos nĂŁo estavam preocupados com as almas dos vikings, e sim encontrar um meio de garantir a paz. Esperava-se que a inclusĂŁo dos vikings na FĂ© pudesse exercer alguma influĂȘncia neste processo. PorĂ©m, muitos nobres e bispos eram contra os tratados com os pagĂŁos, mas os reis supunham que o batismo poderia fazer diferença.
Gradualmente o desdĂ©m dos vikings pelo Cristianismo mudou, e uma das razĂ”es foi que as forças cristĂŁs começaram a vencer as batalhas e ganhar o respeito dos adversĂĄrios. Os reis, Alfredo da GrĂŁ-Bretanha, Constantino da EscĂłcia e Mael Sechnaill da Irlanda, desenvolveram estratĂ©gias que derrubaram a mĂstica da invencibilidade dos vikings.
Mas o que realmente mudou sua opiniĂŁo sobre os cristĂŁos foi o contato com o ImpĂ©rio Bizantino. A partir do sĂ©culo IX os vikings invadiram Constantinopla, a capital do ImpĂ©rio Bizantino, que era a cidade mais magnĂfica que os vikings haviam visto. Era opulentamente rica e foi a primeira potĂȘncia naval capaz de enfrentĂĄ-los e vencer os confrontos.
Um dos pontos de inflexĂŁo mais significativos da cristianização dos vikings foi a conversĂŁo do Rei Harald Bluetooth em 960 AD. *A atual tecnologia bluetooth ganhou o sobrenome do Rei Harald devido Ă sua capacidade de unir partes dĂspares da Dinamarca na Ă©poca, assim como o bluetooth uniu vĂĄrios dispositivos de comunicação*.
Quando os vikings conheceram os reinos cristãos centralizados e ordenados, o exemplo desencadeou a unificação dos reinos escandinavos. Assim, mais nórdicos eram convertidos pelos próprios vikings do que pelos reis cristãos - os reis Harald Gormsson e Olaf Tryggvason aceitaram sua conversão visando a coesão dos vikings.
As populaçÔes das ilhas remotas do Atlùntico Norte juntaram-se à corrente principal europeia, a conversão cristã, devido à pressão da Noruega. A Islùndia converteu-se ao Cristianismo em 1000 AD após consultar sua assembléia nacional, mas as pråticas pagãs ainda eram toleradas.
A Noruega cristianizou-se devido aos reis Olaf Tryggvason e Olaf Haraldsson, que foi canonizado apĂłs sua morte em 1030 AD tornando-se o primeiro santo padroeiro da nação. Haraldsson gravou um texto rĂșnico na 'Pedra de Jelling' afirmando que tornou os nĂłrdicos um povo cristĂŁo.
Os povos do norte se beneficiaram da associação com Olaf Haraldsson, e outros santos vikings surgiram: SĂŁo Erik na SuĂ©cia e SĂŁo Knud na Dinamarca. O condado de Orkney no arquipĂ©lago ao Norte da EscĂłcia, produziu um mĂĄrtir na famĂlia governante: SĂŁo Magnus, morto por volta de 1116 AD numa disputa dinĂĄstica.
No inĂcio do sĂ©culo XI, o imperador bizantino Basil II, o Bulgar assassino, instituiu a Guarda Varangian; uma unidade de elite composta por vikings. Embora tenha sido inicialmente formada por suecos e Rus da Europa Oriental, a Guarda Varangiana logo atrairia os guerreiros nĂłrdicos do mundo viking.
Simultaneamente, os religiosos cristĂŁos desgostosos com a incapacidade dos seus Reis de defendĂȘ-los, começaram a liderar os exĂ©rcitos nas batalhas. VĂĄrios bispos e abades descendiam de famĂlias nobres, e portanto mantinham um extenso conhecimento militar. Assim, tornaram-se lĂderes carismĂĄticos que venceram vĂĄrias batalhas contra os vikings.
A invasĂŁo viking impulsionou a construção das torres nos monastĂ©rios, como em Glendalough na Irlanda. LĂderes natos, como o bispo Heahmund de Wessex, morreram heroicamente nas batalhas. Os vikings perceberam estes fatos, e isto os levou a intuir que o Deus cristĂŁo era um 'deus da guerra' que deveriam respeitar.
Os vikings mais habilidosos distinguiram-se nas carreiras Ă serviço dos Reis cristĂŁos, ganhando tremendo prestĂgio, glĂłria e muita riqueza que acumulavam para o futuro. Estes vikings cristianizados nĂŁo voltavam para casa apenas com seu ouro e as histĂłrias para contar, pois tambĂ©m traziam uma perspectiva e a compreensĂŁo mais profunda do mundo exterior.
Estas batalhas nĂŁo eram tĂŁo diferentes dos ataques viking aleatĂłrios, a nĂŁo ser que a matança e o saque tinham o apoio dos Reis cristĂŁos. Agora, em vez de uma vida apĂłs a morte imersos nos festejos da Valhalla como recompensa por morrer em batalha, os vikings poderiam desfrutar de uma viagem sem escalas atĂ© o paraĂso!
Os vikings nĂŁo se importavam se acabariam no CĂ©u ou na Valhalla, pois quando atacavam, geralmente movidos pela infusĂŁo de plantas alucinĂłgenas, levavam tudo que podiam carregar, incluindo as pessoas como prĂȘmio. Os vikings eram notĂłrios escravizadores e vendiam os cativos nos fervilhantes mercados islĂąmicos.
Os vikings podem ser lembrados pelas notĂłrias expansĂ”es marĂtimas que atingiram diversos territĂłrios do mundo, dentre eles a Inglaterra, EscĂłcia, França, RĂșssia, Irlanda, IslĂąndia e a GroenlĂąndia. Em 1000 AD, criaram uma colĂŽnia de enraizamento na AmĂ©rica do Norte e na costa leste do CanadĂĄ.
Eles permaneciam cada vez mais nas terras que invadiam e muitas vezes criavam laços com os nativos. Por exemplo, os anais irlandeses mencionam grupos de nórdicos jå integrados desde o século IX. Pesquisas de DNA revelaram que cerca de 25% dos homens e 50% das mulheres da Islùndia descendem dos vikings.
Os vikings continuaram politeĂstas e as sagas islandesas refletem o fato. Um exemplo Ă© encontrado na Saga de Erik, o Vermelho, quando Leif Erikson converte sua mĂŁe ao Cristianismo e ela se recusa a dormir com o marido atĂ© que ele se converta - uma grande provação para o velho arredio!
Muitos dos vikings convertidos apenas incorporaram Jesus no seu historismo em vez de rejeitar completamente seus antigos hĂĄbitos pagĂŁos. Encontramos este provĂ©rbio nas sagas vikings: 'Em terra adoro Cristo, mas no mar adoro Thor'. Mas isto nĂŁo era apostasia, mas sim a mente politeĂsta adotando o pragmatismo.
Existem exemplos do politeĂsmo destes novos cristĂŁos no registro viking, pois quando o Rei norueguĂȘs Rolphus encontrava-se Ă beira da morte e doou 100 libras de ouro para a Igreja cristĂŁ local, tambĂ©m executou cem prisioneiros como um sacrifĂcio a Odin. Os vikings demoravam trĂȘs geraçÔes em mĂ©dia para descobrir o significado e aceitar o monoteĂsmo cristĂŁo!
Os cristĂŁos convenceram os nĂłrdicos que seus deuses eram espĂritos inferiores, mas como eram os deuses dos ancestrais, foi impossĂvel removĂȘ-los da identidade cultural. E desta forma, Odin, Freyr, Frigga, Tyr, Vidar, Thor, etc, continuaram vivos. PorĂ©m, ao longo dos sĂ©culos, seus descendentes aceitaram que eram lendas, mas nos dias atuais ainda nĂŁo Ă© uma opção popular!
A ideia de que os antigos deuses carregam 'poderes alternativos' enraizou-se nas lendas islandesas, como as do grimório de Galdrabok, o manual completo da magia nórdica. Porém, os nórdicos da Era Viking tiveram uma visão diferente, pois sustentavam que embora seus deuses servissem ao seu propósito, o tempo os havia apagado.
Mas na verdade o mundo viking ainda era povoado pelos reis, bispos e santos missionĂĄrios convivendo com os antigos deuses e gigantes. Por exemplo, o filho de Odin, Baldur, que carregava uma natureza bondosa e sofreu uma morte injusta, tornou-se figurativamente associado Ă Jesus Cristo.
Na época em que Snorri Sturluson e outros islandeses estavam escrevendo as sagas e a poesia dos ancestrais, laços simbólicos e temas cristãos foram adicionados à este antigo cenårio. Os vikings achavam que as qualidades de Odin eram semelhantes às do Deus do Antigo Testamento.
EvidĂȘncias do sincretismo religioso e cultural sĂŁo evidentes nas tradiçÔes dos feriados, como o Natal cristĂŁo e o Yule nĂłrdico - uma comemoração prĂ©-cristĂŁ. No inĂcio do sĂ©culo XII a Dinamarca construĂra 2000 igrejas, e a Noruega e SuĂ©cia juntas perto de 1000. A SuĂ©cia manteve o paganismo por mais tempo devido ao seu isolamento.
Geralmente os arqueólogos determinam a conversão cristã completa desde a religião nativa observando as pråticas de sepultamento dos povos. Com base nestas descobertas, a Dinamarca, Suécia e a Noruega, jå eram naçÔes cristãs no final do século XII, sem diferenças na transição religiosa em relação aos seus vizinhos.
O conflito de valores entre o paganismo e o Cristianismo foi uma caracterĂstica determinante da Era Viking. Os nĂłrdicos começaram a adotar o Cristianismo em resposta Ă mudança de consciĂȘncia e expansĂŁo global do mundo cristĂŁo. PorĂ©m, o Cristianismo nĂŁo determinou o fim da Era Viking ou induziu a extinção dos vikings!
Algumas das batalhas mais épicas do passado foram travadas por vikings cristianizados. A Inglaterra, a França e Bizùncio usaram o apelo da religião para aproveitar a energia dos vikings nas batalhas, e seus reis usaram sua força para avançarem na busca pelo poder. Mas tudo isto resultou numa imagem imprecisa dos vikings.
Durante sua existĂȘncia eles exploraram os oceanos, comercializaram nos lugares mais distantes do globo e lutaram contra todos que aportaram nas suas terras. Aceitaram os cristĂŁos e outros pagĂŁos com cautela, mas participaram ativamente dos conflitos por eles criados. Afinal, eles gostavam de viver em pĂ© de guerra!
Apesar da sua natureza feroz e sociopĂĄtica, eles tentaram maneiras diferentes de entender e conviver com as diferentes formas culturais, religiosas e o misticismo da Era das Trevas. E mesmo quando o contato entre as duas religiĂ”es dĂspares da Ă©poca tornou-se violento, acabou resultando numa sinergia inesperada.
No entardecer da Era Viking, as naçÔes mantinham uma autoridade central com exĂ©rcitos aptos a criar defesas eficazes. Os guerreiros vikings nĂŁo possuĂam tropas organizadas e suas tĂĄticas eram ineficazes contra os soldados treinados e apoiados pelos Reis cristĂŁos.
Os alvos mais desejĂĄveis dos vikings foram fortificados ou modificados, tornando-os menos suscetĂveis Ă s incursĂ”es dos nĂłrdicos. Os mosteiros construĂram grandes torres de fĂĄcil defesa que serviam como local de guarda para objetos de valor e abrigo para as pessoas no caso de uma invasĂŁo.
A Igreja cristĂŁ chegou oficialmente Ă EscandinĂĄvia no final da Era Viking, e a falta de acordo sobre alguns princĂpios culturais resultou na perda de prestĂgio dos vikings como combatentes. Ălafr Haraldsson pediu que Björn Ironside desistisse das guerras, e insistiu: 'Embora vocĂȘ ache que isso lhe convĂ©m, a lei de Deus estĂĄ sendo violada'.
A Era Viking terminou quando as hostilidades cessaram, e 1066 AD foi o ano do seu epĂlogo. Na Batalha de Stamford Bridge o Rei norueguĂȘs Harald Fairhair foi morto enquanto tentava recuperar uma parte perdida da Inglaterra. Esta foi a Ășltima incursĂŁo dos vikings na Europa, e a Lenda Viking chegava ao fim.
Na antiga escrita, 'vĂkingr' significa invasor, mas poucos nĂłrdicos participaram das batalhas. Os assaltos eram uma ocupação de meio perĂodo praticada por uma pequena porcentagem do povo. Poucos vikings eram profissionais, embora todos estivessem familiarizados com o uso das armas.
Os ataques cessaram porque os tempos mudaram, mas os vikings não foram vencidos e ainda vivem na lembrança do passado. Eles são os noruegueses, dinamarques, faroenses, islandeses e suecos, as pessoas de boa Fé que habitam na Europa!
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